Viés inconsciente nas interfaces conversacionais

Roberta Cadenas
5 min readMay 10, 2019

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Nem todo mundo ouviu falar sobre vieses inconscientes, mas todo mundo já foi afetado por eles de alguma forma.

Ilustração Bel Zynes

Antes de tudo, é importante compreender que o nosso cérebro trabalha reconhecendo padrões.

Imagem da publicação: Vieses inconscientes, equidade de gênero e o mundo corporativo

A verdade é que ele não faz isso por mal, o objetivo de padronizar é poupar energia, nos ajudar a tornar o mundo, ao nosso redor, inteligível e a interpretar situações. É como se você pegasse um atalho quando precisa chegar a algum lugar.

Por outro lado, esses padrões podem afetar diretamente a nossa forma de ver o mundo e, consequentemente, o nosso trabalho.

O que são vieses inconscientes?

Os vieses inconscientes são esses atalhos que o nosso cérebro cria e aciona. O problema é que eles são, naturalmente, tendenciosos e nos impedem de compreender situações, pessoas e coisas como, de fato, são, mas da forma como queremos enxergar.

Existem vários tipos de vieses inconscientes, e esses são os 5 principais:

1 - Viés de afinidade

É a tendência de avaliar melhor aqueles que se parecem conosco.

2 - Viés de percepção

Ocorre quando as pessoas acreditam e reforçam estereótipos sem base concreta de fatos.

3 - Viés confirmatório

É caracterizado pela disposição de procurar informações que confirmem nossas hipóteses iniciais e ignorar informações que coloquem em xeque as nossas crenças.

4 - Efeito halo (auréola)

É a propensão de, a partir de uma só informação positiva ou agradável, ser muito mais disposto a avaliar positivamente o restante das informações, mesmo que não sejam.

5 - Efeito de grupo

É a tendência a seguir o comportamento do grupo para não desviar do padrão vigente. Quem já conduziu Focus Groups sabe muito bem como esse viés funciona.

Como isso afeta as interfaces?

Ao desenvolver o tom de voz para uma empresa, por exemplo. Escolher palavras-chave e #s, pode parecer simples, e até óbvio, mas é preciso ter muita clareza sobre as pessoas que consomem aquela marca ou serviço.

Prints retirados do Twitter

Como vimos na conversa acima, o tom de voz e o uso expressões que não condizem com a realidade do público, mas que fazem sentido para quem projetou, pode soar desastroso.

A criação de uma persona de atendimento é outro momento que pode ser afetado por vieses inconscientes. Você já deve ter reparado que assistentes pessoais são “mulheres”, né? Na verdade, são vozes compreendidas como femininas. Isso porque as pessoas entendem que mulheres são mais agradáveis e cordiais. O que não é verdade, apenas um viés. (E tem pesquisas sobre isso, dá uma olhada aqui, aqui e aqui.)

Antes de definir uma persona é importante questionar quais as suas motivações, como é o cotidiano, se faz sentido ser uma caracterização feminina ou masculina, etc, e garantir que todas essas respostas estejam 100% alinhadas a marca, aos valores da empresa e, claro, ao público.

Na Nextel, por exemplo, a persona de atendimento é uma mulher e essa decisão aconteceu após estudos de público, definição de pilares da empresa, dinâmicas entre as áreas e benchmarks. A Nina, além de estar alinhada com a empresa e o público alvo, foi na contramão da maior parte das personas do mesmo segmento, derrubando vieses.

Linguagem da marca Nextel

E, apesar de parecer óbvio, redobre a atenção na hora de conduzir pesquisas e testes. É frequente esses serem os principais geradores de insumos para desenvolvimento de interfaces, e a linha entre explicar e enviesar (consciente ou inconscientemente) é bastante tênue.

Como treinar para deixar os vieses para lá?

É preciso uma dose de esforço diário e contínua para identificar, reconhecer que temos vieses inconscientes e minimizar a sua influência negativa. Um dos exercícios que procuro fazer sempre é escrever um texto “sem gênero” para diminuir o androcentrismo ao máximo. O que, por si só, já é um trabalhão, pois o nosso idioma é bem androcêntrico.

Vale considerar que nem sempre é péssimo ter um viés “na manga”. Você pode usar o “efeito halo”, por exemplo, a seu favor e escrever interações mais amigáveis, evitando expressões como “infelizmente”, “não consigo” ou “não posso”.

Além disso, colher feedbacks é importante e valioso em todos os cenários, tanto para evolução de interfaces quanto profissional. Então peça e ouça com carinho, as opiniões de outras pessoas sobre o seu trabalho e seu comportamento. Tire o ego da frente, você vai se surpreender com o que pode aprender com isso!

Por fim, busque interagir com pessoas diferentes do seu perfil. É um dos passos mais importantes — e mais difíceis — que podemos dar, não só, em relação às pessoas que usam as nossas interfaces, mas sobre equipe. Para quem é gestor, essa é a comprovação do quanto é necessário ter equipes diversas para que seja possível evoluir processos, produtos e carreiras.

E aí? Rolou curiosidade para saber sobre os seus vieses? O Projeto Implícito criou, há duas décadas, os Testes de Associação Implícita (TAIs), que são divididos por tema como gênero, orientação sexual, idade, peso, etc. Cada teste leva cerca de 10 minutos para ser concluído e traz uma dinâmica de associação de imagens e palavras.

Fica a vontade para descobrir, é só acessar esse link: encurtador.com.br/oDFI5

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